segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

MATÕES NOS ANOS 20 DO SÉCULO PASSADO

Para se ter uma idéia do que era a pequena cidade de Matões, nos anos 20 do século passado, basta fazer uma singela leitura do livro do matõense Raimundo de MOURA RÊGO (1911-1988), nascido no povoado São Pedro, autor de "As mamoranas estão florindo" (Teresina: Projeto Petrônio Portella, 1985, pgs. 63/67).
Ali, o alto funcionário do Ministério da Fazenda, advogado e escritor ilustre deixou-nos registrado:
"São José dos Matões, ou abreviadamente Matões, ao tempo destas histórias, era uma pequena vila do interior maranhense, encravada, como se deduz do próprio nome, em plena mata, longe de tudo – da civilização e do progresso. Terra parada, triste, decadente. Sem luz elétrica, sem gás, sem calçamento, sem serviços de água e de saúde, não vivia, vegetava o seu atraso de duzentos anos com a maior resignação, sem queixar-se da sorte, que a enjeitara, nem dos governos, que a esqueceram. Sem estradas, tinha no rio, ainda assim distante três ou quatro léguas de caminhos estreitos e pedregosos, a única via de transporte para o escoamento dos produtos naturais em que a terra é verdadeiramente rica.
Duas longas ruas interrompidas pelos largos da igreja matriz de Nossa Senhora e da capela de São Sebastião, e mais algumas travessas divisórias, umas e outras com o casario baixo mal seguro nas taipas, e eis toda a vila. Meu tio Senhô dizia que, saindo de casa no começo de uma rua, ia até o fim, voltava pela outra e em menos de dez minutos estava novamente em casa, desde que não encontrasse alguém para conversar.
E Matões tinha tudo para ser a terra da promissão: água pura e saudável, solo fértil, clima ideal, sem calor nem frio excessivos o ano inteiro. Apenas, em junho, um friozinho seco e gostoso.
E a gente: simples, hospitaleira, comunicativa, a melhor do mundo. De índole pacífica, a gente de Matões não cultivava inimizades, não provocava brigas. Seus juízes, que nem lá moravam, tinham pouco a fazer. Não a atormentavam os atropelos e os problemas das cidades grandes. Cadeiras, postas nas calçadas à tarde ou à noite para as rodas de amigos, podiam ficar esquecidas até o dia seguinte que ninguém as levava. Tudo isso devia concorrer para manter melhores as condições humanas. Sem médico e serviço de saúde pública, o índice de mortalidade poderia parecer elevado. No entanto, Matões era terra de velhos. (...)
Para nós, de São Pedro e arredores, São José era simplesmente a “vila”. Uma terra parada,  aonde íamos uma vez ou outra apanhar a correspondência no correio, feito em lombo de burro, via Caxias. Uma terra que dava a impressão de estar sempre adormecida à sombra das velhas mamoranas.
Mas tudo se transformava, como por encanto, na época da festa do Divino. Com antecedência de meses o povo se preparava, fazendo roupas novas, engalanando as casas, escolhendo dádivas para os leilões. Até a Prefeitura melhorava o aspecto urbano, tapando alguns buracos nas ruas e capinando o mata-pasto que teimava em invadir, ousadamente, a praça da matriz.(...)
Após a festa do Divino, tudo terminava. Um silêncio enternecido derrama-se por todo o vilarejo.
Matões adormeceu, de novo."

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