Senador Demóstenes Torres
Deu no Blog de José Roberto de Toledo (jornalista de o "Estadão").
A cada novo “grampo” vazado da Operação Monte Carlo se aprende um
pouco mais sobre o funcionamento da República. Sabe-se, por exemplo,
que o senador Demóstenes Torres (ex-DEM) era um ágil despachante dos
interesses do empresário preso Carlinhos Cachoeira: pedia favores,
cobrava contrapartidas, intercedia junto a agentes públicos. Tudo em
nome do amigo com quem manteve mais de 300 conversas telefônicas em
curto período de tempo.
Aprende-se também que para ser nomeado para um cargo público de
chefia no governo de Minas Gerais (e em Goiás, em Brasília etc) não é
preciso nem currículo. Basta uma sequência de telefonemas entre
poderosos e seus cupinxas e o emprego se materializa com rapidez de
corar burocrata.
Mônica Vieira liga para o primo Carlinhos Cachoeira, que liga para o
amigo Demóstenes Torres, que liga para o colega de Senado Aécio Neves,
que obtém o aval do governador Antonio Anastasia para o secretário de
Governo de Minas Gerais ligar para Mônica comunicando sua nomeação. O
ciclo se fecha com 4 graus de separação, ou melhor, de conhecimento. Na
contabilidade do repórter Fausto Macedo, bastaram 12 dias e 7
telefonemas.
Se todo brasileiro desfrutasse de tanta presteza e gentileza do poder público o Brasil não seria o Brasil.
Mônica disse à reportagem do Estado que foi nomeada para ser chefe
regional da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de Minas por
sua “competência”, por seus 25 anos de carreira. Pode ser, mas quem
apadrinhou sua nomeação não sabia disso.
Aécio perdera o currículo de Mônica. Foi o que Demóstenes relatou a
Cachoeira, em telefonema na noite de 20 de maio do ano passado. Aos
repórteres, o senador tucano disse desconhecer a origem do pedido de
nomeação. Mesmo sabendo muito pouco ou quase nada, passou-o à frente.
Talvez retribuísse algo, ou quisesse ficar com crédito junto a
Demóstenes, contra quem até então “não recaía questionamento”, nas
escolhidas palavras de Aécio.
Patrocinador da nomeação de Mônica, Cachoeira não enfatiza as
qualidades profissionais da prima ao despachar com o amigo Demóstenes.
O apelo é pessoal: “É importantíssimo pra mim. Você consegue por ela lá
com o Aécio (…). Pô, a mãe dela morreu. É irmã da minha mãe”. Só se
preocupam com o salário, que não pode ser menos do que R$ 10 mil -“se
não estou perdida”, na expressão de Mônica. E quem não estaria? Uns 190
milhões de brasileiros.
Em outro “grampo”, descobre-se que Demóstenes -mais uma vez no papel
de despachante de Cachoeira- deixou “intranquilo” Maguito Vilela
(PMDB), um ex-governador de Goiás que agora é prefeito de Aparecida de
Goiânia. A intranquilidade seria fruto de conversa do senador com o
político goiano. Demóstenes relata ter dito que Cachoeira estava “uma
onça” com Maguito, por causa da falta de celeridade no cumprimento de
um acordo entre ambos.
Não fica claro o porquê de Demóstenes ser o intermediário da
cobrança, de ser ele a dizer que seu representado estava uma fera, em
lugar de o próprio Cachoeira arreganhar os dentes para Maguito. Pelo
jeito, cada um com seu papel.
Entre um despacho e outro com Cachoeira, Demóstenes encontrava tempo
para cobrar honestidade de seus pares, em entrevistas a meios de
comunicação e em discursos na tribuna do Senado. Antes dos “grampos”,
só essa parte de sua vida pública era de conhecimento público.
Com a CPI que se instala nesta quarta-feira, mais “grampos” devem
ser desengavetados. Mais lições sobre o funcionamento da República
serão oferecidas aos interessados. Mais bastidores da vida pública
aparecerão.
O maior bem que a CPI pode fazer à sociedade é liberar todos os
“grampos”. Os vazamentos pontuais implicam uns mas podem omitir
outros. O controle do fluxo de informações em escândalo dessa magnitude
é o que todos os partidos buscam, para defenderem-se e atingirem os
adversários. Só a liberação geral e irrestrita das gravações minimiza o
uso político e eleitoral da CPI. A alternativa deixa o público a quatro
ou mais “grampos” de separação da verdade.
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