O amigo e advogado Sálvio Dino de Castro e Costa (o pai), atual presidente da Academia Grajauense de Letras, emprestou-me dia desses uma preciosa Revista, já um tanto gasta e surrada pelo tempo, pois se trata de uma edição do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (ano VII, dez/1956), onde encontrei um interessante e raro artigo que noticia sobre a chamada "Lenda de Sumé", de autoria de Virgilio Domingues Filho, que trago hoje à postagem, para conhecimento dos internautas. Ei-la abaixo, na íntegra:
"As crônicas antigas revelam que
os gentios do noroeste maranhense guardaram a lembrança da passagem, há
séculos, por aquelas plagas, de um venerando ancião, de longas barbas, todo
bondade, que viera de longes terras para ensinar aos nativos os meios de subsistência
na vida terrena e o meio de nela se conduzirem para alcançar a bem-aventurança
da vida eterna, quando fossem chegados os tempos.
Este santo homem teria ensinado
aos indígenas daquela região a cultura da mandioca e o seu uso na feitura de
alimentos, ao mesmo tempo em que lhes ministrara ensinamento de uma nova
religião, que recomendava a igualdade e a fraternidade como lema para toda a
humanidade.
Quando do descobrimento do
Brasil, nos idos de 1.500 da era cristã, indígenas do noroeste do Maranhão
teriam mostrado aos portugueses recém-chegados as pegadas e os sinais deixados
por aquele devotado pregador, o qual, após haver lançado as bases da religião
de Cristo nestas plagas da América, desaparecera para o lado das praias...
O estranho personagem, de alma
limpa e coração puro, a quem os ameríndios chamaram, por corruptela linguística,
“Sumé”, teria sido o grande apóstolo São Tomé, destacado para a evangelização
da Etiópia, da Índia e de outras terras que se descobrissem.
Conta-nos a lenda que, à hora do
pôr-do-sol, à ave-maria, o bondoso velho chamava os silvícolas à oração,
agitando com a mão um pequeno sino, que os nativos chamavam “maracá”.
Maracá Sumé (sino de Tomé) teria
sido a origem da palavra Maracassumé (ou Maracaçumé), nome de uma Cidade (nota:
localizada na Região do Alto Turi) e de um rio, dos mais importantes, aliás, do
noroeste maranhense.
Historiadores há que acolhem
estes fatos como verídicos; outros os contestam, admitindo-os como lenda.
Em 1.632 o Sumo Pontífice Urbano
VIII julgou não aceitável a vinda daquele apóstolo a esta parte do Novo Mundo,
desautorizando a versão.
Na “História da América
Portuguesa”, de Sebastião da Rocha Pitta, 2ª edição, 1.880, páginas 31-32,
encontramos esta passagem:
“A vinda do glorioso Apóstolo S.
Tomé anunciando a doutrina católica, não só no Brasil, mas em toda a América,
tem mais razões para se crer que para se duvidar; pois mandando Cristo Nosso
Senhor aos seus sagrados Apóstolos pregar o Evangelho a todas as criaturas e
por todo o mundo, não consta que outros viessem a esta região, tanto séculos
habitada antes da nossa redenção; e depois de remidas tantas almas, não deviam
ficar mil e quinhentos anos em ignorância invencível da lei da graça; e posto
que nas sortes tocasse a este santo Apóstolo a missão da Etiópia e da Índia e se
não fale na América (então por descobrir) não se pode imaginar que faltasse a
providência de Deus a estas criaturas com a pregação, que mandara fazer a todas.”
[...].
Também faz referência a este fato
o notável investigador e historiador Cândido Costa, em sua preciosa obra “As
Duas Américas”, 2ª ed., às páginas 97-99:
“Parece não haver dúvida, pela
leitura das páginas anteriores, de que a América, antes de ser conhecida pelos
povos cultos, já o era em épocas pré-históricas, comprovando esse acerto os sinais
de antigas civilizações e os monumentos que são a cada passo assinalados em
diversas regiões do novo continente.
Bem conhecida é a lenda da vinda
do apóstolo São Tomé, que passou na América por um semideus, e os Tupis
conservavam a crença de ter sido ele quem lhes ensinara o uso e a cultura da
mandioca; e aos portugueses, nos primeiros tempos do descobrimento do Brasil,
mostravam os indígenas as pegadas do venerando ancião, que era pintado com
longas barbas.
Sebastião da Rocha Pitta,
historiador brasileiro de reconhecido mérito, tratando do santo varão a que a
Igreja católica presta fervente culto como mártir da religião de Cristo, aceita
a possibilidade da vinda desse herói do cristianismo às plagas americanas,
considerando um milagre da Providência a sua pregação em um continente habitado
por gentios.
O que é certo é que, quando se
vem aproximando o dia de Natal, os índios Turás e outros semicivilizados têm
por costume improvisar festas e folguedos desse santo. Reconhece-se, porém, que
não o fazem por espírito cristão; o que os move é simplesmente a tradição dos
antepassados.
Pedro de Ribadaneira, padre da
Companhia de Jesus, na “Vida de S. Tomé”, quer que aquele santo tenha pregado
no Brasil em sua missão de apóstolo. Há historiadores, porém, que combatem essa
lenda, e o Papa Urbano VIII, não a julgando aceitável, proibiu-a em ordem
datada de 15 de março de 1.632.”
O Prof. Byron de Freitas, nosso
conterrâneo e grande estudioso da terra e coisas do Maranhão, assim se expressa,
à página 52, de seu opúsculo “O Noroeste Maranhense”:
“Maracá...sumé... Sumé, na
opinião de alguns historiadores, seria a corruptela indígena de São Tomé, o
apóstolo que teria evangelizado parte do Brasil. Tal lenda, sem dúvida, foi
condenada pela Igreja, à falta de provas”.
Sabe-se, ainda, que a lenda
intitulada SUMÉ foi impressa em Madrid, em 1.855, e reimpressa no “Panorama”
nesse mesmo ano.
Mas, em se considerando lenda,
que diremos da origem do nome do cabo de São Tomé e da ilha de São Tomé, “que
jaz toda fora da equinocial para o norte, e não atravessada dela como a
demarcaram os antigos cosmógrafos”, na expressão de Rocha Pitta?"
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