quinta-feira, 8 de março de 2012

OS SENADORES E SEUS SUPLENTES: UMA ANTIGA POLÊMICA




O Senado Federal compõe-se de 81 representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário, ou seja, escolhe-se o candidato que obtiver o maior número de votos válidos.
Sucede que, pela norma constitucional em vigor, cada Senador será eleito com dois Suplentes. Por conta disso, vez por outra o Senado é ocupado por algum suplente de senador, que ali toma assento e exerce todos os direitos e prerrogativas que são inerentes àquele cargo eletivo.
Questão antiga e polêmica, muita discussão tem-se visto em torno da necessidade ou não da manutenção dessa regra, que, não fosse a ausência de legitimidade popular do “reserva”, acaba por tornar letra fria o princípio republicano de que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição Federal.
Por dever do ofício que exerço, não me cabe tecer críticas aos outros Poderes, devido à independência e harmonia que existe entre eles. Cada um que conviva e cuide dos seus próprios problemas: o Judiciário procure acabar com a sua histórica morosidade; o Legislativo trate de extirpar os vampiros, sanguessugas e mensaleiros de seus quadros; e o Executivo que zele o dinheiro do contribuinte, guardando-o em cofres seguros e à prova de corrupção. Todavia, como cidadão, nada impede de manifestarmos nosso humilde pensamento.
Ora, quando o eleitor escolhe o seu candidato ao Senado, mesmo sem saber (em muitíssimas das vezes) está votando também em duas outras pessoas, os suplentes, que compõem a chapa com o candidato principal, o qual enfrenta a campanha e cuja fotografia aparece na urna eletrônica.
A bem da verdade, tais suplentes podem “arrancar” o mandato do titular em casos de morte, doença, licença para assumir outro cargo (Ministro, Secretário de Estado, etc.), renúncia ou quando o cargo é declarado vago, com a conseqüente burla à soberana vontade popular, oriunda do sufrágio universal e do voto direto e secreto, de igual valor para todos.
Diga-se ainda que os suplentes, na maioria dos casos, estão ligados ao titular da chapa por motivos financeiros, visando a custear as elevadas despesas de campanha, bem como em razão de vínculos puramente empresariais ou familiares que mantém entre si, fazendo com que, nesta última hipótese, haja a transformação do poder senatorial em clãs de pai para filhos, genros e sobrinhos, entre tantos outros da parentela do senador.
O sistema de escolha dos suplentes é alvo de constantes propostas legislativas para alterá-lo. Conforme o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que foi autor de um projeto para mudar a situação (PLS 29/95), “a suplência partidária, eleita de forma indireta, confere ao suplente poderes que excedem a soberania popular que rege o processo eleitoral brasileiro”.
O falecido senador amazonense Jefferson Peres já dizia: “Temos exemplos recentes de falta de representatividade, com suplentes que exerceram, ou vão exercer, mais de sete anos de mandato, por força de morte ou renúncia do titular. Uma verdadeira usurpação de mandato, aberrante na democracia, regime no qual não se pode admitir representação política sem voto”.
Porém, o projeto do citado senador paulista acabou sendo rejeitado por questões formais, ainda na Comissão de Constituição e Justiça, uma vez que somente poderia ser tratado no bojo de emenda à Constituição. Mas há em trâmite no Congresso várias emendas no mesmo sentido (PEC’s 41/99, 5/01, 24/01, 11/03 e 8/04).
Para ilustrar, já tivemos até caso em que um suplente de senador assumiu a Presidência da República. É que, uma vez tomando posse, em eleições internas do Senado, os suplentes podem ganhar a legitimidade necessária, inclusive para liderar bancada parlamentar, presidir comissões e fazer parte da Mesa Diretora.
Esse, aliás, foi o caso do senador José Fragelli (PMDB-MS), eleito presidente da Casa em 27.02.1985, quando se vivia face crucial na política brasileira. Naquele ano, o País se preparava para a chamada transição democrática para a Nova República, com a eleição de Tancredo Neves, pelo colégio eleitoral, para a ocupar o cargo de Presidente da República. O presidente do Senado, eleito para o biênio 85/87, seria o responsável por dar posse ao novo chefe do Executivo federal, na condição de presidente do Congresso Nacional.
Diante da polarização daquele momento, Fragelli se candidatou à Presidência do Senado, dividido entre peemedebistas e pedessistas, vindo a derrotar o senador baiano Luiz Viana (PDS) por 38 votos a 29. Contudo, em vez de Tancredo Neves, o presidente do Senado teve que dar posse ao vice, o maranhense José Sarney.
Aqueles anos antecederam a instalação da Assembléia Nacional Constituinte e os debates sobre a nova ordem jurídica do país davam a tônica dos trabalhos do Congresso, que tinha como presidente da Câmara o finado deputado Ulysses Guimarães. Sem vice, em caso de viagem de Sarney, Ulysses assumia a Presidência. Mas em setembro de 1986, ausente o presidente da Câmara, Fragelli chegou a ocupar o Palácio do Planalto por nove dias (in Jornal do Senado, Brasília, 16 a 22.10.2006, pg. 10).
Está aí colocado o tema para discussão, neste momento em que se vê tanto falatório na mídia sobre a pretendida Reforma Política. O que não se sabe é se algum fruto bom será de fato colhido, sob a perspectiva de se respeitar à sagrada vontade do eleitor brasileiro, ou se de novo os parlamentares darão um “abraço de tamanduá” no povo, como dizia o personagem “Zeca Diabo”, da novela O Bem Amado, escrita por Dias Gomes.

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